A ESTRADA
The road
Cormac McCarthy
Tradução de Adriana Lisboa
240 páginas
Alfaguara (Objetiva), 2006
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A ideia de um mundo devastado pela guerra tem inspirado vários escritores, especialmente os de ficção científica. É enorme a quantidade de histórias que mostram homens lutando contra seus semelhantes pela sobrevivência. Os derrotados são escravizados ou devorados pelos vencedores.
Criar algo original com um tema bastante explorado é um grande desafio. O escritor Cormac McCarthy não se intimidou. O resultado é um romance comovente cujo ponto forte reside na relação entre os dois protagonistas, pai e filho, que lutam para sobreviver em uma América pós-apocalíptica.
Com a proximidade de um inverno bastante rigoroso, os dois personagens principais decidem seguir por estradas abandonadas em direção à costa, mesmo não sabendo o que encontrarão por lá. Para essa perigosa jornada, pai e filho contam com um carrinho de compras, uma pequena quantidade de alimentos, cobertores em farrapos e um revólver com poucas balas para se defenderem dos grupos de assassinos e canibais que vagam pelas estradas.
O autor fornece poucas informações sobre o que aconteceu com a Terra. Através das memórias do pai, é possível deduzir que houve uma guerra mundial, embora não seja revelada a causa. Também é dito o que aconteceu com a mãe do menino. Para não estragar a diversão dos que forem ler a obra, nada será dito sobre o destino da personagem.
Doente e atormentado por pesadelos, o pai se esforça para passar segurança ao menino e não demonstrar fraqueza. O amor que sente pelo filho é o que o impele a seguir em frente, além de não o deixar enlouquecer ou se entregar à selvageria.
Mesmo crescendo num cenário hostil, o menino é capaz de atos de bondade e compaixão. Quando encontra um outro menino, ele pede ao pai que adote a criança perdida. Em outro momento, o garoto insiste para que o outro protagonista dê um pouco de comida a um velho que encontraram na estrada. A maior demonstração de bondade acontece quando o filho implora ao pai para poupar a vida do ladrão que os havia roubado.
Apesar de gerar alguns pequenos desentendimentos, o protagonista adulto aprecia e incentiva o lado humanitário do filho. O pai sempre afirma que eles são os “caras do bem” e que “levam o fogo”. Esse fogo simbólico é o amor, sentimento que os mantém unidos e os impulsiona a prosseguir em sua jornada em busca de salvação. Enquanto houver um ser humano capaz de amar o próximo, haverá a possibilidade, mesmo pequena, de que a humanidade abandone novamente a barbárie e crie uma nova sociedade.
Apesar de triste, o final do livro traz uma mensagem de esperança, além de mostrar o quanto o menino amadureceu. Os mais sensíveis irão derramar algumas lágrimas. Os mais resistentes sentirão um nó na garganta.
O uso de termos gastronômicos pode não ser a maneira mais original de atestar a qualidade do romance de Cormac McCarthy, mas expressa bem o valor do livro. O autor é um grande chef, consegue criar um prato saboroso e sofisticado a partir de um simples arroz com feijão. Usa um ingrediente tão batido como o tema do mundo pós-apocalíptico e adiciona como tempero a relação entre pais e filhos.
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